segunda-feira, 24 de março de 2014

SPIELBERG E A INFANTILIZAÇÃO DO CINEMA AMERICANO



O cinema americano sempre foi comercial. Com exceções, sempre almejou as bilheterias. Afinal, Hollywood é um empreendimento. Mas nesse lucrativo negócio, sempre houve espaço para o experimental, para o diferente. 

Isso até Steven Spielberg entrar na parada. 



Depois de dois curta metragens, ele estreou no cinema de maneira brilhante com  ENCURRALADO. Longa elogiadíssimo pela crítica, também foi sucesso de público. Seu filme seguinte, LOUCA ESCAPADA mostrou que o jovem diretor realmente tinha talento e veio para ficar. 

Mas foi com sua produção seguinte que as coisas no cinema dos EUA mudariam para sempre. TUBARÃO (JAWS) foi um estrondoso arrasa quarteirão (vulgo, blockbuster). Mas a forma como isso aconteceu é que chama a atenção.



A agressiva campanha de marketing em todos meios de comunicação, o trailer criativo e sua divulgação em todos os canais mexeram com o imaginário do público. Os custos foram relativamente baixos, mas o lucro foi astronômico: mais de meio bilhão de dólares. Um recorde para os idos de 1975.

Mas a produção foi um divisor de águas. Mostrou o caminho fácil para se lucrar grandes somas. Spielberg foi o precursor, seguido depois pelo amigo George Lucas, responsável por infantilizar a ficção científica com seu dramalhão mexicano (“Luke, eu sou seu pai”) STAR WARS. 



JAWS também agradou os integrantes da academia: foi indicado a melhor filme, mas venceu nas categorias técnicas de melhor trilha sonora, melhor montagem e melhor som.

A partir daquele momento, os produtores deram preferência pelo caminho mais fácil. Películas que fossem apostas certas e que seguissem certos clichês dariam o tom. E com o passar dos anos , as coisas pioraram.



Comparando com as décadas anteriores, no século XXI pouco se produziu dramas em Hollywood. Gênero que serve de plataforma para os verdadeiros atores/atrizes mostrarem seus talentos, assim como roteiristas e diretores. A essência de interpretar reside nos dramas.

Com a aposta em superproduções, a quantidade de filmes realizados claramente diminuiria. Se até os anos 90 eram realizados cerca de 300 filmes por ano nos Estados Unidos, em 2011 esse número chegou à 95.

Uma produção não pode faturar menos de 250 milhões, caso contrário será considerado um fracasso; principalmente devido aos elevados custos. 



Um filme como HOMEM DE FERRO 3 teve um custo orçado em 200 milhões. Só o salário de Robert Downey Jr (Tony Stark), entre salário e participação na bilheteria, chegou quase a 20% desse total. Se o filme não render, no mínimo o triplo, será considerado um fracasso.

Antes os espectadores americanos eram mais sofisticados, mais exigentes. Hoje, na era de TRANSFORMES e VELOZES E FURIOSOS tudo se torna palatável ao sistema. Não há mais o senso crítico de outrora.

Filmes que as vezes ficavam em cartaz por meses, atualmente fica de 5 a 7 semanas, para logo a seguir ser substituído por outro. Nos anos 80, a película 9 E MEIA SEMANAS DE AMOR chegou a ficar 18 meses em exibição em São Paulo.

A palavra de ordem é investir em produções que possam ser facilmente digeridas pelo grande público e com sequências a granel. Aí, pega-se uma ideia, que já não é das mais inovadoras e estica-se a piada por duas, três ou até cinco continuações. 

Usando as redes sociais para fomentar a divulgação dos filmes, os estúdios de Hollywood pretendem cativar, acima de tudo, o público jovem, principal público-alvo e o que melhor faz a propaganda '‘boca a boca’'.

E com a predominância dos blockbusters e o consequente emburrecimento dos espectadores, a criatividade sucumbiu. Tanto que muitos artistas têm buscado outras alternativas, como a TV.

Se para se realizar um filme os roteiristas devem se curvar aos ditames hollywoodianos, nas emissoras de televisão, o controle criativo por parte dos autores originais é muito maior. Alguns conseguem manter poder total sobre suas obras, como no caso de Vince Gilligan com seu fenômeno BREAKING BAD.



Os resultados têm agradado e a busca pelo que é inovador aumentou. Se ainda há o lugar-comum, com séries previsíveis e enfadonhas, as emissoras de TV a cabo (HBO, AMC, Showtime, STARZ) tem obrigado os canais tradicionais (ABC, NBC, CBS, FOX) a saírem da mesmice e buscarem roteiros mais elaborados. 



A concorrência se acirrou ainda mais com a chegada ao mercado da Netflix, que já oferecia serviço de TV por Internet, e que conta com mais de 44 milhões de assinantes em mais de 40 países com um acervo de mais de um bilhão de horas de filmes e séries. Mas que optou por gerar conteúdo próprio com seriados que fogem do tradicional como HOUSE OF CARDS e ORANGE IS THE NEW BLACK.



Talvez a TV consiga reensinar Hollywood a ser criativa novamente. Há cerca de 40 anos, Spielberg encontrou uma estrada lucrativa, que os executivos do show business souberam aproveitar como ninguém. Mas, quando a fonte secar –no momento são as franquias baseadas em histórias em quadrinhos as que mais fazem dinheiro – será necessário se reinventar, voltar aos primórdios do cinema, onde muitas vezes, apenas uma câmera na mão e uma ideia na cabeça já eram suficientes para entreter a plateia, ávida por novidade.




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